...assim descobrirá uma imensidão de coisas para se viver. ;)
Quando ainda somos pequenos, (refiro-me a um período em que adotamos algo como modelo de vida e julgamos o restante como o modelo errado, ou seja, a aborrecência) querendo ou não, ficamos dotados de certos preconceitos que muitas vezes fizeram-nos perder momentos que poderiam ser lembrados pelo resto de nossas vidas, como histórias contadas por pessoas desconhecidas, passeio com alguém que julgava careta, e assim por diante. A questão é que seria exatamente desses encontros que talvez poderiam ter saído suas histórias mais legais, mas por simples capricho, ou ignorância mesmo, você deixou de vivê-los. Digo isso porque já passei por essas situações, as quais se pudesse voltar atrás teria a certeza de que delas sairiam algo bom, proveitoso.
Mas não estou aqui para falar exatamente sobre isso, queria apenas fazer uma prévia para contar a vocês um pouco da minha viagem de volta para Brasília, e digo viagem porque vim de ônibus, caso contrário, seria um pulo, pois de Mara Rosa até aqui são 320 quilômetros (eu acho perto =P), o que dobra quando se fala em bus.
Bem, ao longo da viagem vim conversando com um homem que adorava contar casos. Aí já sabem né, eu apenas concordava com a cabeça e o resto era ele quem comandava, e como gosto muito de escutar tais histórias, não me importei nem um pouco com isso. Ele começou falando sobre sua juventude, de como era legal estar com seus amigos e aprontar com eles. Vou tentar incorporar uma personagem aqui e reproduzir o que ele disse. .-.
" Era bom demais o tempo que eu ainda era moleque de tudo, que a gente inventava algo para ganhar uma grana extra. Uma vez, quando trabalhávamos para uma firma, resolvemos dar uma de videntes, e sobrou pra eu ser o vidente da história. Olha só o que fazíamos: um amigo nosso saía com as mulheres da redondeza, paquerava elas e daí descobria tudo sobre suas vidas. Então ele chegava em casa e contava tudo para mim, depois se encontrava com as mulheres em uma nova oportunidade e dizia: nossa, lá na firma tem um cara que é bom demais como vidente, sabe tudo do seu passado e ainda lhe dá conselhos para seguir em frente, porque sabe tudo o que irá acontecer contigo também. Ah menina, aí era batata! A fulana chegava lá, eu falava pra ela tudo o que meu amigo tinha dito e contava algumas mentirinhas sobre seu futuro. E com essa brincadeira deu para arrecadarmos um dinheirinho até bom. Teve uma vez que tiramos mil e duzentos só de uma mulher. Mas você sabe né, isso era coisa da juventude, hoje em dia eu sou evangélico e não faço nada dessas coisas."
" Teve a vez em que fomos pra casa de um conhecido nosso, e justamente nessa casa morava uma velhinha que eu nunca tinha dado certo com ela. Era emburrecida demais, não gostava que a gente fizesse nada do que queríamos, e tudo pra ela estava ruim. Até aí estava tudo certo, mas não é de ver que a tal da velha resolve morrer bem no dia em que eu tinha ido pra lá!?! Ah, mas pra quê?! Quando resolvo ir embora, isso já entardecendo, o neto dela diz que eu ia encontrá-la bem numa virada que tinha no caminho, que veria seu caixão perto de uma árvore, porque nunca tinha gostado dela mesmo, e por isso ela aproveitaria para se vingar de mim bem nessa noite. Menina do céu, quando estava chegando na tal da virada minhas pernas começaram a tremer, comecei a suar, e para mim, eu tinha mesmo visto o caixão da velha bem debaixo da árvore. Mesmo sabendo que estava tendo aquelas visões somente por causa do medo, voltei pra casa dele na hora, não ia conseguir passar sozinho por ali nunca! O resultado disso tudo foi que passei a noite toda acordado e só no outro dia voltei pra casa. Meus amigos ficavam rindo da minha cara o tempo todo, dizendo que tinha medo de gente morta, que era um mais medroso do que tudo."
" Uma vez fui passar uns dias na casa de um velho que se achava muito esperto, só que ele estava doente. Então começou a dizer que estava com muita vontade de comer uma sopa, que era pra eu fazer essa sopa o mais rápido possível, disse também que queria só se fosse sopa de galinha. Pois bem, sabe o que eu fiz? Matei o único galo que ele tinha além de escolher entre tantas galinhas que tinha na fazenda. Preparei a sopa, ele agradou e comeu foi muito. Depois quando estava melhor foi olhar suas criações e deu falta do galo. Ficava gritando por conta desse galo, reclamando sua falta e tudo mais. Só que aí já era tarde, né... Eu já tinha ido embora, e galo ido pra panela há muito tempo."
Eu não queria saber se agora ele é evangélico, disso pouco me importava, nem ao menos como ele estava vivendo agora. Adorei mesmo foi ter escutado um pouco de seu passado, sobre como ele tinha sido louco, feliz. Mas o que eu achei mais interessante de tudo isso foi quando uma mulher surda entrou no ônibus na rodoviária de Uruaçu vendendo canetas e ele além de pagar somente a sua, disse que era para eu ficar com a caneta também. Depois que ela saiu ele me informou que sempre quando passa por ali a ajuda comprando suas canetas. Talvez isso não sirva para acrescentar nada na vida de ninguém, mas para mim, naquele instante, estava sendo bastante legal ouvir sobre suas aventuras e ver que ainda existem pessoas legais, que acima de tudo são humildes e ajudam o próximo sem nada querer em troca disso. Assim, deixo registrado aqui que muitas coisas boas podem deixar de fazer parte da nossa história quando passamos a ver os outros com muita indiferença. Deixe de lado isso que te impedem de escutar outra pessoa, que te faz não olhar para o lado e cumprimentar alguém que lhe deseja um bom dia, seja mais humano.